terça-feira, 3 de março de 2009

ACRE ME TENS DE REGRESSO!

CRÔNICA DA RECHEGADA

- Ding, dong! Gritou o aeroporto no meu peduvido.

-Deus, eu nem acredito nisso. O que eu vou fazer lá? Indaguei ao Espírito, capiongo como quem não gosta de sair de casa, viajar sozinho pela lapa do mundo.

Empombei e, em menos de fósforo, estava na fila do embarque, atrás duma réa que arrastava dois meninos buchudos, amarelos empambados e com os olhos de jabuti comendo cajá.

-Devem ser de Porto Velho! Pensei alto, com o olhar no pinga pinga de quem sai do Galeão de madrugada rumo a Rio Branco.

Do vera, de lá pra cá até o tratamento dos comissários vem mudando.

O povo que embarca vem mudando.

- Lá, eu conheço até os cabras que empurram o avião! Continuo matutando, agora sobre o fim do caminho. “Faltam só mais umas seis horas...já, já eu chego em casa!”, me escancho na esperança.

Quem sabe aonde vai não tropeça no caminho!

- Bam! Bam! Bam!

A zuada, lá longe abafa o ronco, que tira fino do ar- condicionado comprado fiado ao Dilô, amigão de sempre e que, sem consentimento da Fatinha, acha que eu dou pra deputado.

O paidéguão de 30 mil BTU’s também não abafa os gritos da atubibada dupla da Roda Viva, eficiente que nem diácono em Santa Ceia, mais obediente do que ajudante de missa.

- Bom dia! Respondo, barra- limpa: feliz com o final da novela; certo do adeus ao Rio.

Também, pudera: vim pra não ficar mas fui ficando...fiquei!

Toda vez que o aeroporto grita – Ding..dong! no meu peduvido eu lembro da ida.

Eu achava que ia ficar, mas fui voltando...voltei!

- Seu Antônio, sua mudança chegou! Onde nós descarregamos? Me avisam, eu custo a crer.

– Puxa, vou dormir de novo na minha cama, e é bem capaz que a minha camisa do Botafogo ainda esteja limpa! Penso alto, vendo a velha casa e sua portabilidade.

Só acreano e jabuti carregam a casa nas costas.

A bandeirinha da Minha Pátria está dentro de uma caixa dessas, entre as páginas da minha Bíblia Shedd, engilhada e cheia de poeira, desses quase seis meses em que ouvi o – Ding..dong! do Galeão e deixei os cultos da minha amada igreja de Copacabana.

No fundo, o Espírito já tinha me avisado.

Com olhos de jabutí comendo cajá, agora eu sei: voltei!

- Vô!

É o Natan, reivindicando o mingau!

Meu netinho vai ser acreano.

O aeroporto me chama, de novo:

-Atenção, senhores passageiros com destino a Cruzeiro do Sul...

É bem ali; segunda- feira eu tô no Quinarí. Agora eu to em casa.



MINIDICIONÁRIO DE ACREANÊS

PEDUVIDO – Pé do ouvido; orelha

CAPIONGO – Tristonho

LAPA DO MUNDO – Por aí; mundo afora

EMPOMBEI – Determinei- me

EM MENOS DE FÓSFORO – Rapidamente

EMPAMBADOS – Com cara de doentes

OLHOS DE JABUTÍ COMENDO CAJÁ – Olhos cheios dágua

ESCANCHO – Aboleto; sento descansado

PAIDEGUÃO – Enorme

ATUBIBADA – Agoniada

BARRA- LIMPA – Dividido em dois; picolé de dois sabores que se vendia antigamente em Rio Branco

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